• O AMOR, quando se revela,


    Não se sabe revelar.


    Sabe bem olhar p'ra ela,


    Mas não lhe sabe falar.



    Quem quer dizer o que sente


    Não sabe o que há de dizer.


    Fala: parece que mente...


    Cala: parece esquecer...



    Ah, mas se ela adivinhasse,


    Se pudesse ouvir o olhar,


    E se um olhar lhe bastasse


    P'ra saber que a estão a amar!



    Mas quem sente muito, cala;


    Quem quer dizer quanto sente


    Fica sem alma nem fala,


    Fica só, inteiramente!



    Mas se isto puder contar-lhe


    O que não lhe ouso contar,


    Já não terei que falar-lhe


    Porque lhe estou a falar...

     

     

    Fernando Pessoa


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    é magia e é arte que

     

    nos faz inventar, sonhar e viajar.

     

    Com imaginação podemos ir a Marte

     

    ou ao centro da Terra, ou ao fundo do mar.

     

    Com imaginação nunca estamos sozinhos.

     

    A imaginação é um voo, um lugar 

     

    onde temos amigos, onde há outros caminhos

     

    nos quais, sem te mexeres, podes ir passear.

     

    Inventa uma cantiga, um poema, um desenho

     

    um arco-íris, um rio por entre malmequeres;

     

    esse lugar é teu, sem limite ou tamanho.

     

    A esse teu lugar, só vai quem tu quiseres

     

     

    Rosa Lobato Faria


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    Se eu morrer de manhã


    abre a janela devagar


    e olha com rigor o dia que não tenho.



    Não me lamentes. Eu não me entristeço:


    ter tido a morte é mais do que mereço


    se nem conheço a noite de que venho.



    Deixa entrar pela casa um pouco de ar


    e um pedaço de céu


    - o único que sei.



    Talvez um pássaro me estenda a asa


    que não saber voar


    foi sempre a minha lei.



    Não busques o meu hálito no espelho.


    Não chames o meu nome que eu não venho


    e do mistério nada te direi.



    Diz que não estou se alguém bater à porta.


    Deixa que eu faça o meu papel de morta


    pois não estar é da morte quanto sei.

     

     

     

    Rosa Lobato Faria


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    Nua, mas para o amor não cabe o pejo


    Na minha a sua boca eu comprimia.


    E, em frêmitos carnais, ela dizia:


    – Mais abaixo, meu bem, quero o teu beijo!



    Na inconsciência bruta do meu desejo


    Fremente, a minha boca obedecia,


    E os seus seios, tão rígidos mordia,


    Fazendo-a arrepiar em doce arpejo.



    Em suspiros de gozos infinitos


    Disse-me ela, ainda quase em grito:


    – Mais abaixo, meu bem! – num frenesi.



    No seu ventre pousei a minha boca,


    – Mais abaixo, meu bem! – disse ela, louca,


    Moralistas, perdoai! Obedeci...

     

     

     

    Olavo Bilac


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    Foste o beijo melhor da minha vida,


    ou talvez o pior...Glória e tormento,


    contigo à luz subi do firmamento,


    contigo fui pela infernal descida!



    Morreste, e o meu desejo não te olvida:


    queimas-me o sangue, enches-me o pensamento,


    e do teu gosto amargo me alimento,


    e rolo-te na boca malferida.



    Beijo extremo, meu prêmio e meu castigo,


    batismo e extrema-unção, naquele instante


    por que, feliz, eu não morri contigo?



    Sinto-me o ardor, e o crepitar te escuto,


    beijo divino! e anseio delirante,


    na perpétua saudade de um minuto...

     

     

    Olavo Bilac


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