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    Quando Vier a Primavera

    Quando vier a Primavera, 
    Se eu já estiver morto, 
    As flores florirão da mesma maneira 
    E as árvores não serão menos verdes que na Primavera passada. 
    A realidade não precisa de mim. 

    Sinto uma alegria enorme 
    Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma 

    Se soubesse que amanhã morria 
    E a Primavera era depois de amanhã, 
    Morreria contente, porque ela era depois de amanhã. 
    Se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir senão no seu tempo? 
    Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo; 
    E gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse. 
    Por isso, se morrer agora, morro contente, 
    Porque tudo é real e tudo está certo. 

    Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem. 
    Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele. 
    Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências. 
    O que for, quando for, é que será o que é. 

    Alberto Caeiro, in "Poemas Inconjuntos" 
    Heterónimo de Fernando Pessoa 

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    Todas as cartas de amor são


    Ridículas.


    Não seriam cartas de amor se não fossem


    Ridículas.

     

    Também escrevi em meu tempo cartas de amor,


    Como as outras,


    Ridículas.

     

    As cartas de amor, se há amor,


    Têm de ser


    Ridículas.

     

    Mas, afinal,


    Só as criaturas que nunca escreveram


    Cartas de amor


    É que são


    Ridículas.

     

    Quem me dera no tempo em que escrevia


    Sem dar por isso


    Cartas de amor


    Ridículas.

     

    A verdade é que hoje


    As minhas memórias


    Dessas cartas de amor


    É que são


    Ridículas.

     

    (Todas as palavras esdrúxulas,


    Como os sentimentos esdrúxulos,


    São naturalmente


    Ridículas.)


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    Eu não sei senão amar-te,


    Nasci para te querer.


    Ó quem me dera beijar-te,


    E beijar-te até morrer.

     

     

    Fernando Pessoa


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  • O AMOR, quando se revela,


    Não se sabe revelar.


    Sabe bem olhar p'ra ela,


    Mas não lhe sabe falar.



    Quem quer dizer o que sente


    Não sabe o que há de dizer.


    Fala: parece que mente...


    Cala: parece esquecer...



    Ah, mas se ela adivinhasse,


    Se pudesse ouvir o olhar,


    E se um olhar lhe bastasse


    P'ra saber que a estão a amar!



    Mas quem sente muito, cala;


    Quem quer dizer quanto sente


    Fica sem alma nem fala,


    Fica só, inteiramente!



    Mas se isto puder contar-lhe


    O que não lhe ouso contar,


    Já não terei que falar-lhe


    Porque lhe estou a falar...

     

     

    Fernando Pessoa


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    é magia e é arte que

     

    nos faz inventar, sonhar e viajar.

     

    Com imaginação podemos ir a Marte

     

    ou ao centro da Terra, ou ao fundo do mar.

     

    Com imaginação nunca estamos sozinhos.

     

    A imaginação é um voo, um lugar 

     

    onde temos amigos, onde há outros caminhos

     

    nos quais, sem te mexeres, podes ir passear.

     

    Inventa uma cantiga, um poema, um desenho

     

    um arco-íris, um rio por entre malmequeres;

     

    esse lugar é teu, sem limite ou tamanho.

     

    A esse teu lugar, só vai quem tu quiseres

     

     

    Rosa Lobato Faria


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